domingo, 15 de janeiro de 2023

Democracia jabuticaba e o paradoxo da tolerância

Este ensaio não possui a pretensão de apresentar uma reflexão refinada sobre os acontecimentos da política contemporânea nacional, este ensaio é de caráter introdutório, para aos interessados pela temática, orientamos a leitura da bibliografia mencionada.
Meus agradecimentos ao meu amigo Matheus Garcia pelas longas conversas sobre os desdobramentos da política nacional e por me incentivar a escrever este pequeno ensaio.
 
O que é democracia? O que é liberdade, quais são os limites desta liberdade? Essas são algumas das inquietações que devemos levar em consideração quando estamos interessados em compreender a contemporaneidade, para ser mais específico, os rumos da política contemporânea. 
Como bem sabemos, após os horrores das Guerras Mundiais e com a Guerra Fria (1947-1991) as disputas pelas narrativas tornaram-se cada vez mais acirradas, ao mesmo tempo houve uma tentativa global em consolidar a democracia como um regime político. 
Em rápidas palavras, a democracia pode ser entendida como um regime político em que os cidadãos participam diretamente ou indiretamente (elegem representantes políticos) na elaboração, aplicação de leis e até mesmo influenciando nas maneiras em que um determinado representante político exerce o seu poder sobre a sociedade.
Para corroborar, destacamos um trecho do verbete  "Democracia" do Dicionário de política (1998), de Norberto Bobbio (1908-2004).
"Na teoria política contemporânea, mais em prevalência nos países de tradição democrático-liberal, as definições de Democracia tendem a resolver-se e a esgotar-se num elenco mais ou menos amplo, segundo os autores, de regras de jogo, ou, como também se diz, de "procedimentos universais". Entre estas: 1) o órgão político máximo, a quem é assinalada a função legislativa, deve ser composto de membros direta ou indiretamente eleitos pelo povo, em eleições de primeiro ou de segundo grau; 2) junto do supremo órgão legislativo deverá haver outras instituições com dirigentes eleitos, como os órgãos da administração local ou o chefe de Estado (tal como acontece nas repúblicas); 3) todos os cidadãos que tenham atingido a maioridade, sem distinção de raça, de religião, de censo e possivelmente de sexo, devem ser eleitores; 4) todos os eleitores devem ter voto igual; 5) todos os eleitores devem ser livres em votar segundo a própria opinião formada o mais livremente possível, isto é, numa disputa livre de partidos políticos que lutam pela formação de uma representação nacional; 6) devem ser livres também no sentido em que devem ser postos em condição de ter reais alternativas (o que exclui como democrática qualquer eleição de lista única ou bloqueada); 7) tanto para as eleições dos representantes como para as decisões do órgão político supremo vale o princípio da maioria numérica, se bem que podem ser estabelecidas várias formas de maioria segundo critérios de oportunidade não definidos de uma vez para sempre; 8) nenhuma decisão tomada por maioria deve limitar os direitos da minoria, de um modo especial o direito de tornar-se maioria, em paridade de condições; 9) o órgão do Governo deve gozar de confiança do Parlamento ou do chefe do poder executivo, por sua vez, eleito pelo povo (BOBBIO, 1998, p. 326-327).
Como podemos perceber, a concepção que temos (ou que deveríamos  ter) sobre o conceito de democracia é mais complexo do que podemos imaginar.
Através desta  concepção de democracia, é válido pressupor que em um regime democrático, os cidadão possuí direitos e deveres, um destes direitos do cidadão é a da livre expressão, mas o que é livre expressão? Em rápidas palavras a livre expressão pode ser caracterizada como um direito que o indivíduo possui para expressar as suas opiniões, atividades artísticas, científicas, intelectuais etc, sem sofrer nenhuma forma de censura por parte do Estado.
A partir desta breve apresentação do que é entendido como liberdade de expressão, é interessante nos questionar se essa liberdade de expressão possui alguma implicação ética em nossa sociedade, existe algum limite para essa concepção de liberdade?
O filósofo austríaco Karl Popper (1902-1994) introduz o Paradoxo da tolerância, para questões de didatismo iremos recorrer a famosa ilustração do paradoxo.
O paradoxo da tolerância de Karl Popper nos mostra o perigo se partirmos do pressuposto de que a liberdade de expressão é ilimitada. Antes de adentrarmos no paradoxo propriamente dito, gostaríamos de chamar atenção que ao fazermos uma rápida digressão sobre o passado do filósofo austríaco, iremos descobrir que o filósofo além de presenciar os horrores da II Guerra Mundial (1939-1945) é de origem judia. Cabe destacar que no campo da filosofia, diversos filósofos como Hannah Arendt (1906-1975), Hans Jonas (1903-1993) e Theodor Adorno (1903-1969) irão chamar a atenção para os horrores da guerra e a implicação dela ao longo dos Séculos XX e XXI nos mais diversos campos do conhecimento, no entanto, neste momento, gostaríamos de chamar atenção para o campo da ética e da política.
Ao nos voltarmos para a história da democracia no Brasil, veremos que a democracia no Brasil é recente, possui aproximadamente 56 anos, desses 56 anos, também perceberemos que há tensões.
Nas últimas décadas no cenário político tem surgido uma série de discursos que possuem clara alusão a violência a democracia, ou seja, o discurso de ódio tem ganhado força cada vez mais, o curioso é que os "defensores" do discurso de ódio argumentam que apenas estão expressando as suas opiniões, em alguns casos até sugerem há respaldo jurídico para tal.
A partir disto é possível chegar à seguinte conclusão: o que realmente acontece é uma série de equívocos, uma nação que possua um regime democrático bem consolidado não tolera passivamente o discurso de ódio/discurso do intolerante, pois esse discurso corrói a democracia. O que fazer para eliminar o discurso de intolerância? 
Uma iniciativa razoável é a de conscientização dos limites éticos e jurídicos da liberdade de expressão dentro de uma democracia.

 
Leituras recomendadas:
 
Karl Popper - A sociedade aberta e seus inimigos, vols. 1-2.

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